domingo, 10 de junho de 2012

BORDANDO A VIDA



Da esquerda: Ester, Zélia, Elza, Eunice
      Fazendo uma retrospectiva vejo que a arte de bordar sempre fez e faz parte da vida de muitas mulheres em minha família. Mulheres de Minas que tecem no bordado sua história, na realidade simples de suas vidas. Mulheres de famílias autossustentáveis e autodidatas onde o conhecimento era passado dos mais velhos para os mais novos. Mulheres calejadas nas precisões da vida, que aprenderam nas dificuldades a se contentarem com pouco, a não desperdiçar nada, a transformar tudo em algo útil. Mas pagaram um preço pela vida contida. Há nelas uma certa dureza e muitas vezes colocam o dever acima de si mesmas. Aprenderam a desconfiar dos sonhos e a se realizar nos outros, na doação, no serviço. Mas, no deserto de suas vidas uma flor insiste em brotar, uma flor que muitas vezes é revelada em seus bordados.

      Minha família é muito simples, do interior, da roça. Uma família com valores claros, definidos. Com grande fé em Deus e coragem para trabalhar e vencer as dificuldades da vida. A vida dura não deixava muito espaço para a beleza. Mas as mulheres da família semeavam beleza nas flores do jardim e nos bordados. Somos mulheres fortes e frágeis. Que se deixaram levar pela vida e por circunstâncias que não podiam ser vencidas no momento, mas que no silêncio e no trabalho alcançaram a vitória e foram muito além do que as limitações da vida e cultura lhes permitiam. Mulheres que venceram barreiras e deram significado às suas vidas. Que, de muitas formas, estiveram à frente do seu tempo, sem fazer alarde. Somos sobreviventes, resistentes.  Sempre procurando conservar o espírito jovem, tendo motivação para viver, abrindo-se para a vida. Vida que muitas vezes nos levou por caminhos que nunca pensamos trilhar, sem deixar que o tempo e as mudanças nos abatam. Nosso corpo envelhece, enfraquece, nossa alma cresce. Muito desta força foi, e é, tecida em nossos bordados. Bordamos nossas alegrias e tristezas; bordamos para assimilar os golpes da vida; bordamos como forma de recolhimento para achar forças para o passo seguinte.

          Bordamos a vida... o bordar é tão mágico quanto ler um bom livro. Ambos nos levam a um mundo diferente – mundo das letras e imaginação, mundo dos pontos e cores criando beleza. Minhas irmãs fizeram e fazem o tecido, o bordado, da minha vida. Aprendi muito com elas.

     Enfim, bordar para nós é lazer, descanso, exercício de criatividade para o cérebro, forma de oração, recolhimento em si mesma para vencer as dificuldades da vida.  Assim vamos nós bordando a vida. Num trabalho em que o espiritual e o emocional se entrelaçam nesta atividade humana. Bordar a vida é para nós uma forma de encontrar o divino e costurar os contrários em nós.

     Não tive a oportunidade de ver muitos bordados antigos, mas existe esta bela toalha de bordado vazado feita por tia Lia. Tia Lia nasceu em 1888 e era a filha mais velha dos meus avós paternos. Ela mesma desenhava o risco. Esta toalha ela bordou para as bodas de ouro dos pais, em 1936. É interessante que olhando algo que ela bordou posso sentir um pouco de sua vida e de como era ser mulher na época em que ela viveu, pois, sempre revelamos um pouco de nós naquilo que fazemos.

Toalha de mesa feita pela Ester.


Ester, minha irmã mais velha, borda ponto cruz e é especialista em bordado livre. Aprendi a costurar com ela.








Jogo de cozinha feito pela Zélia



A Zélia faz de tudo um pouco, mas sua especialidade é o ponto cruz e crochê.












A Elza borda belos quadros. O meu preferido é este sobre a natureza que ela me deu de presente.
Outro quadro da Elza


Almofada em patchwork crazy



Eu já fiz de tudo, mas atualmente minha paixão é o patchwork, especialmente o crazy e apliquê.



Rendo minha homenagem à todas as mulheres da família que bordam a vida.








3 comentários:

  1. Tia, segurei o choro para conseguir terminar de ler esta postagem!
    Nossa família toda borda, cada uma faz um ponto diferente...
    Eu adoro ponto cruz, mas, neste final de semana, na roça, comecei a fazer o patch aplique... Vamos ver o que vai dar!
    Sua almofada ficou lunda, adorei, tento me inspirar muito em você quando quero aprender ou fazer algo novo, pois sua criatividade é maravilhosa... Saudades de você! Beijão...

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  2. Olá Nice!!

    Bela mensagem! Uma homenagem emocionante.
    Sou apaixonada pelos trabalhos das nossas bordadeiras.
    Amei sua almofada, mesmo sem vê-la pronta.
    Hoje alinhavei a minha e confesso que pensei: será que vou conseguir?!
    Bem, eu não tenho muita prática em bordado, mas tudo que gostei e me propus a aprender até hoje eu aprendi.
    Que o Senhor me ajude neste novo desafio.

    Abraços,
    Karine

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  3. ei vó!!! lindo o seu post! fiquei orgulhosa de fazer parte dessa familia!!! amo mto as minhas tias avós... alias a familia toda de minas! mesmo com tanta distancia eu sempre lembro deles e tenho mto carinho por todos eles....

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